Foi em 1986 que conheci o trabalho de Hayao Miyazaki, um nome obscuro para quem gostava de animes como Samurai Kid, Super-Homem do Espaço, Fantomas e Speed Racer, entre outros. O Sesc Pompeia estava promovendo um Festival da Cultura Japonesa e em um dos cantos exibia o desenho Nausika.
Detalhe: era uma cópia em VHS sem legenda. Para entender um pouco da história, os organizadores imprimiram um panfleto contado a história de Nausicaä do Vale do Vento (1984). Naquele momento, mesmo com a deficiência da qualidade visual do VHS, dava para perceber o que esse tal de Miyazaki estava fazendo: uma obra-prima da animação.
O filme correu o mundo, enquanto ele trabalhava em outras obras que se transformaram em clássicos cultuados e sucessos comerciais. A lista é enorme e uma boa parte esses desenhos animados estão disponíveis na Netflix. Todos, de uma forma direta ou não, relacionados com questões de sentimentos humanos frente a natureza intangível.
Mundos mágicos, realidades alternativas e fantasias orgânicas estão na obra desse incrível animador e seu lendário Estúdio Ghibli, que acabou ganhando um Oscar® pelo fantástico A Viagem de Chihiro, em 2001. Foi Hollywood se curvando ao trabalho magistral desse jovem de 83 anos.
Criatividade
E no auge de sua criatividade, Miyazaki concebe a sensível animação O Menino e a Garça. A história é simples: Mahito, de 12 anos, é obrigado a se mudar para o interior do Japão, depois que sua casa é destruída por um ataque aéreo durante a Segunda Guerra Mundial. Ele perde a mãe e vai com o pai para uma nova cidade.
Introspectivo, Mahito sente falta da mãe mas não destrata a madrasta que está preste a lhe dar um irmãozinho. Em meio a tudo isso, Mahito descobre que uma velha garça que frequenta o lago perto de sua casa, lhe diz que sua mãe está viva em outro mundo.
Aí está a ligação com a fantasia presente na obra de Miyazaki. O garoto segue as instruções da garça, revelando que a torre abandonada ao lado de sua casa, tem portas para outras dimensões e realidades. Em uma delas pode estar o caminho para reencontrar a mãe.
Visual soberbo
Não preciso reforçar que o visual das obras de Hayao Miyazaki é soberbo e parece ser um personagem à parte. Criaturas simples, como periquitos, transformados em guerreiros sanguinários, compõem esse cenário que ajuda a entender as motivações de Mahito.
Tudo parece ter saído de sua própria imaginação, mas com a realidade sendo empurrada em um confronto que pode não ter um resultado positivo para o garoto. Mas isso seria revelar mais do que o necessário sobre O Menino e a Garça.
É a segunda vez que o cenário da Segunda Guerra Mundial é usado como pano de fundo da história. Enquanto em Vale do Vento vemos o construtor dos caças Zero, os lendários kamikazes, afinal, o pai do garoto trabalha em uma indústria que constrói caças. O importante é frisar que na obra de Miyazaki são os sentimentos puros que movem seus personagens.
Seja o coração solitário de uma guerreira como Nausicaä, preocupada com a preservação da natureza, ou a busca de algo que cure a dor da perda que vemos no jovem Mahito. É essa busca pelo sentimento puro que faz da obra de Hayao Miyazaki única. Muito diferente da pasteurização sentimental dos recentes desenhos do poderoso estúdio Disney.
O Menino e a Garça está na disputa do Oscar® de melhor animação. Toda a torcida para o reconhecimento de uma obra-prima. Estreia 22/2 distribuído pela Sato Company.
