Crítica | Filme | Quebrando Mitos

Crítica | Filme | Quebrando Mitos

O documentário Quebrando Mitos não poderia chegar em momento mais oportuno. E distribuído de maneira mais adequada. O mais recente trabalho de Fernando Grostein Andrade e Fernando Siqueira estreou na página www.quebrandomitos.com.br no dia 16/9/22.

Praticamente duas semanas antes das eleições no Brasil. E tendo como pauta o atual presidente, Jair Bolsonaro.

Pois Quebrando Mitos compila imagens antigas e recentes e depoimentos de políticos, jornalistas, pensadores, líderes sociais e ativistas para estabelecer um paralelo entre a vida de Andrade e a de Bolsonaro. Vai além. Ouve também amigos de infância e pessoas próximas ao político, que recontam um pouco da sua trajetória ainda nos tempos que sonhava em ser militar.

Nada de novo no front

Para ser honesto, nada de novo é revelado. De fato, tem sido possível conferir muitos detalhes de sua vida pela lente do microscópio desde que foi eleito. A imprensa tem escarafunchado bastante e os fatos têm surgido. A passagem polêmica pelo serviço militar, as frases polêmicas, os comportamentos polêmicos, os gestos polêmicos, a administração polêmica.

Por causa do seu estilo, essa talvez seja a marca indelével de sua gestão. Contudo, a narrativa concentrada na vida de Andrade é que alimenta Quebrando Mitos. Essa sua batalha contra o obscurantismo vem de longe. Antes mesmo de Jair Bolsonaro tornar-se uma alternativa viável nas eleições de 2018, quando se elegeu.

Mais especificamente quando Fernando, em suas palavras, “saiu do armário”. Praticamente ao mesmo tempo em que um político radicado no Rio de Janeiro defendia a ditadura e destilava ódio contra os LGBTQs. O futuro presidente…

Apesar do programa de governo um tanto vago, Bolsonaro conseguiu atrair votos para si tirando do armário ultrarradicais outrora acanhados. Tudo isso e um pouco mais é didaticamente relembrado por imagens dignas da propaganda nazista.

Relembrando fatos

Novamente, ainda que o brasileiro tenha memória curta, tudo o que é relembrado em Quebrando Mitos é bem recente e está acessível a todos. O que deu trabalho mesmo foi revirar acontecimentos trágicos e desagradáveis, como a morte da deputada Marielle Franco, por exemplo.

O desgaste de Andrade foi tamanho que ao final do primeiro corte do documentário teve que dar um tempo no trabalho.

Isso de focar na história de Bolsonaro deixou a versão muito difícil de ser vista, segundo ele. Claro, repassava por várias desgraças, com discursos inflamados de ódio e agressividade.

Foi a interferência de Fernando Siqueira que lançou luz sobre o caso e conduziu Quebrando Mitos para uma versão mais leve. Ele lembra que apontou a câmera para o cineasta, o que o ajudou a encontrar novos ângulos para o projeto. Daí, Siqueira e Andrade passaram oficialmente a assinar a direção do projeto. “Acho admirável o quanto ele se propõe em desafiar as normas que foram impostas pela geração dele”, diz Siqueira.

A história

O intento dos dois Fernandos em Quebrando Mitos foi revelar a masculinidade catastrófica e frágil de Jair Bolsonaro, sob o ponto de vista deles. Um casal LGBT que vive no exílio desde 2019 por causa do posicionamento político de Fernando Grostein Andrade contra Bolsonaro. A ameaça que decretou a decisão foi um recado anônimo (claro!): “Se continuar a falar de política, o seu velório será com caixão lacrado”.

Só que o trabalho de Andrade como cineasta já seguia essa linha de luta contra o obscurantismo. Como em Quebrando o Tabu, quando defendeu que o tema das drogas deveria ser tratado como questão de saúde e não com punição criminal.

É importante destacar que Quebrando Mitos, apesar do título jocoso, é propositivo. Não destrutivo.

A ideia é garantir a participação de todos na política. Não exclusivamente de homens, brancos e heterossexuais. “Masculinidade não precisa ser catastrófica. É importante dizer que isso não é uma crítica ao masculino, afinal sou um homem gay. Não estou falando que os homens não têm que participar do poder. Estou dizendo que o poder precisa ser dividido. Cabe mais gente. Quando todo mundo olha uma coisa pelo mesmo lado, todo mundo só enxerga o mesmo ângulo. Quem perde é a sociedade, porque eliminamos assim a inteligência coletiva”, explica o cineasta.

Segundo ele, o privilégio vem acompanhado de responsabilidade. Não dá para nos calarmos diante de pessoas que divergem de nossas opiniões. E é a voz em off de Andrade que ouvimos durante todo o documentário, “com o propósito de estimular e ampliar a discussão entre LGBTQs e seus familiares, além de aproximar indivíduos com visões políticas distintas, ajudando indecisos a votarem conscientemente”.

Em suma, Quebrando Mitos é a contribuição do casal às famílias e eleitores. Uma produção da Film Soul, nova produtora de Andrade.

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