Responsável por Baile Perfumado (1996), um dos marcos da Retomada do cinema nacional, Lírio Ferreira assume novos riscos criativos em Serra das Almas. O filme aposta em uma narrativa não linear, em que relações antigas se desgastam e desconhecidos se aproximam, enquanto a tensão cresce em um cenário árido e desafiador. À medida que a violência entra em cena, os afetos ganham peso dramático, colocando o espectador no centro da ação ao lado dos protagonistas.
Julia Stockler, Mari Oliveira e Pally Siqueira lideram o elenco de forma potente. Suas personagens, inicialmente desconectadas, desenvolvem uma relação marcada pela solidariedade em meio ao caos. Como destacou Stockler, o filme estabelece uma interessante dicotomia entre os modos como homens e mulheres lidam com o medo: “de um lado, os homens se matam; do outro, as mulheres, que nem se conhecem, se cuidam”.
A paisagem do agreste pernambucano não apenas ambienta, mas compõe a essência do filme. A Serra das Almas se impõe como um personagem vivo, que molda o comportamento dos protagonistas e reforça o senso de comunidade entre elenco e equipe. Sua presença física e simbólica influencia diretamente as emoções e os conflitos da trama, contribuindo para o caráter mitológico que permeia o longa. E, claro, acompanhado por pouquíssima trilha sonora, que também reforça a proposta.
O assalto que movimenta a história é apenas o ponto de partida para mergulhar em traumas, medos e conflitos sociais. Lírio Ferreira transforma o crime em uma verdadeira panela de pressão emocional, onde cada personagem precisa confrontar o passado enquanto enfrenta dilemas morais e existenciais. A tensão é construída com precisão, tornando o suspense palpável do início ao fim.
Serra das Almas reafirma a força do cinema nacional em um momento de grande efervescência criativa. Com direção cuidadosa e fotografia marcante e atuações intensas, o filme merece uma conferida, para quem quer sair do lugar comum do cinema brasileiro. Estreia em 24/4 distriubído pela Imagem Filmes.
