Quem nunca pensou em vingança após ser enganado? Ainda mais sabendo que o crime geralmente termina com a vítima amargando o prejuízo e ainda a vergonha de ter se deixado enganar e sem grande impacto sobre o criminoso? Esse é o tema de Cloud – Nuvem de Vingança, longa de Kiyoshi Kurosawa – nenhuma relação com o grande Akira Kurosawa – que acompanha a história de um homem sem escrúpulos que tem de encarar suas vítimas.
Tudo começa em Tóquio, onde Yoshii (Masaki Suda, narrador original de O Menino e a Garça) mantém um negócio de vendas online que vai de artigos genuínos, como figuras de personagens de anime, à venda de bolsas de grife falsificadas, aproveitando-se igualmente da fragilidade de fabricantes e compradores. Às vezes, funciona, outras nem tanto. Num desses dias de vacas gordas, Yoshii deixa o trabalho numa fábrica e muda da capital para uma casa no campo onde vai se dedicar às vendas. Junto vai sua namorada, Akiko (Kotone Furukawa, de Roda do Destino).
Uma casa maior, no entanto, não se converte em mais espaço. Desde o início, Yoshii transita por lugares apertados, se contorcendo entre corredores lotados de caixas e prateleiras. Não há decoração, objetos que identificam gostos ou hábitos. Tudo se concentra em como obter produtos, colocar à venda online e observar a tela doentiamente até que o lote seja vendido. Não há nem mesmo um objetivo ou motivo, um alvo que será atingido quando as vendas chegarem a um certo valor. Isso até o grupo de compradores descontentes descobrir a identidade de Yoshii e partir para o ataque.
A partir daí, o filme se transforma em uma perseguição violenta que finalmente tira Yoshii de seu distanciamento, o horror do primeiro tiro se convertendo e se transformando, a morte seguinte bem mais fácil do que a anterior. Entram na receita elementos de casa invadida, um tanto de terror, com um animal morto anunciando o que vem a seguir e thriller cibernético com uma sequência assustadora em que Yoshii mostra à namorada seu novo endereço e só depois percebe que há uma pessoa por perto que pode ter olhado a tela de seu celular. Vem ainda uma crítica feroz à economia do século 21 das plataformas de vendas online que geram figuras como Yoshii. Pessoas que se não chegam a cometer crimes, exploram a inocência ou fraqueza alheia sob a definição larga de “esperteza”. Mas é a conexão de um dos personagens com o crime organizado japonês que causa maior surpresa, deixando ao final algumas perguntas sobre o destino de Yoshii quando se torna devedor de um favor tão grande. Estreia em 10/7 distribuído pela O2 Play.
