Crítica | Filme | Apocalipse nos Trópicos

Crítica | Filme | Apocalipse nos Trópicos

A cineasta Petra Costa, assim como muitos outros nomes do cinema nacional, divide opiniões. Ainda mais em um país dividido e que, possivelmente, já conferiu um de seus trabalhos, o documentário Democracia em Vertigem (2019), que chegou a ser indicado ao Oscar.

Pois em sua mais recente produção, Apocalipse nos Trópicos (2024), recém lançado na Netflix, Petra promete repetir a dose ao focar em um tema vespeiro: a população evangélica no Brasil e sua participação política. Vespeiro porque cresceu sensivelmente o número de evangélicos no Brasil segundo dados do mais recente censo do IBGE e eles também estão numericamente bem representados em mandatos políticos nas mais diferentes esferas.

Se pensarmos no crescimento do catolicismo ao longo dos séculos e desde seu surgimento, e o compararmos ao crescimento no número de evangélicos (religião surgida bem mais recentemente), o placar é bem superior aos 7 a 1 da Alemanha contra o Brasil na Copa de 2014.

E tudo bem, isso não é problema para a maioria dos brasileiros, que ainda acredita na Constituição e defende o estado laico previsto nela. Contudo, a partir do momento em que os evangélicos adentram a esfera política ou apoiando candidatos ou elegendo os seus próprios, ouvimos da boca de governantes como Bolsonaro que o Brasil não é laico.

Para quem insiste jogar dentro das quatro linhas, a afirmação parece ir contra a Constituição. Não seria esta a primeira e nem a última patacoada dele. Enfim, segue o jogo.

Este cenário rapidamente descrito aqui é explorado em detalhes por Petra em Apocalipse nos Trópicos. Foca em especial na ascensão de Silas Malafaia, desde o momento em que apoia Lula em 2002 até seu ato recente de ventriloquismo em discurso de Bolsonaro, quando atua como coach do capitão.

Petra vai até os anos 1950 nos EUA, quando o também pastor Bill Grahan falava aos seus fiéis sobre os malefícios do Marxismo. Discurso aparentemente incorporado por Malafaia para criticar Lula, PT e os “esquerdopatas” às vésperas das eleições de 2018 e 2022.

As apresentações de Malafaia realmente impressionam pela energia e a escolha minuciosa das palavras. Mas é nos bastidores que ele impressiona mais, por exemplo, adotando um tom levemente ameaçador ao lembrar das promessas de Bolsonaro aos seus fiéis, de que nomearia um ministro terrivelmente evangélico para o Supremo. E das possíveis consequências se não cumprisse com isso.

Impressiona mais ao revelar-se indignado com a saída de Bolsonaro do país após a derrora nas eleições de 2022, desafiando-o a arcar com as consequências dos seus atos e classificando-o como covarde por partir para os EUA.

Enfim, aprendi com um excelente professor que a História só pode ser examinada devidamente com o passar de um tempo. Na época, falava-se em 20 anos. A maioria dos fatos apresentados por Petra Costa faz parte da história bem recente do Brasil.

Com Apocalipse nos Trópicos, ela acelera um pouca essa examinação. E a História costuma servir (entre outras coisas) para balizar o presente de olho no futuro.

Se você prefere fugir desses assuntos mais sensíveis, digamos, melhor assistir a um dorama. A Netflix oferece várias opções.

Agora, se quer atuar mais como cidadão brasileiro, fazendo valer seu voto cada vez mais e cobrando daqueles que você ajuda a eleger o que foi prometido antes da eleição, confira Apocalipse nos Trópicos. Não vai mudar o Brasil, mas pode ajudar a mudar a maneira como você quer que o Brasil seja.

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