Se existe algo que hoje a ficção tem sido mais fiel à realidade, é a lendária busca pela verdade. Não falo sobre filmes envolvendo agentes secretos em suas missões para finalizar planos de dominação global escondidos em mentiras políticas. Refiro-me a pequenas pérolas criadas por roteiristas e diretores preocupados em mostrar que, apesar das divisões políticas que o mundo vive, ainda há espaço para contar boas histórias sobre a busca incessante pela verdade.

Poderíamos mencionar filmes como a comédia clássica A Primeira Página (1931) e sua versão de 1940, dirigida por Howard Hawks, com Gary Grant e Rosalind Russell, que abordam com muito humor dois jornalistas descobrindo uma farsa durante a fuga de um prisioneiro. Ou até citar clássicos do jornalismo, como Todos os Homens do Presidente (1976), que revela o escândalo de Watergate, que derrubou o governo Nixon. Outro exemplo é Conspiração e Poder (2015), que traz à tona uma situação incômoda envolvendo o presidente George W. Bush.

A série Inimiga do Povo é uma homenagem a todos os jornalistas sérios que buscam, em suas reportagens, a verdade acima de tudo. A história começa com uma avalanche de comentários negativos sobre uma reportagem escrita por Kajta Salone (Kreeta Salminen), que trabalha em um dos principais jornais de Tampere, uma das cidades mais importantes da Finlândia.

O motivo de tanto ódio é uma reportagem sobre o ídolo do futebol Sanule Tolonen (Jussi Partanen), atualmente jogador do Barcelona. Segundo a matéria de Kajta, Sanule teria prometido uma doação de 1 milhão de dólares para melhorar o estádio do seu time de origem, mas, por algum motivo ainda não revelado, ele não fez a doação.

Se você, leitor, conhece a paixão que os torcedores de futebol têm por seus ídolos, sabe exatamente o tipo de hostilidade que a repórter enfrenta por causa dessa matéria. Uma preocupação que leva o editor-chefe do jornal Aamusanomat a questionar se ela checou todos os fatos antes de publicar a reportagem. Kajta, por sua vez, mostra todos os passos que deu para apurar os dados, enfatizando que não obteve um depoimento de Sanule, que não retornou suas ligações.

A história poderia ter ficado por aí, transformando a série em um telefilme de 70 minutos. No entanto, o que acontece a seguir é chocante. Sanule confirma que daria um depoimento para Kajta, esclarecendo o que aconteceu com a doação que ele não fez. O problema é que o jogador é encontrado morto em sua mansão à beira da praia, afogado na piscina.

Teria sido um acidente? A polícia espanhola acredita que alguém tentou fazer parecer que Sanule escorregou, bateu a cabeça na borda da piscina e acabou inconsciente dentro da água, levando ao seu afogamento. No entanto, Kajta acredita que há algo muito estranho acontecendo nessa história. O que um jogador popular de futebol, que iria falar sobre uma doação não realizada, faz sendo assassinado em sua própria casa?

A questão é que a jornalista não mede esforços em sua busca pela verdade, o que a coloca em rota de colisão com interesses econômicos que geraram a morte do jogador. Quais seriam esses interesses e quem lucraria com a morte de Sanule? Essas são as perguntas que a jovem repórter tentará responder, enfrentando forças perigosas e violentas, onde palavras escritas não são obstáculos para a ganância.

Inimiga do Povo é uma série que nos leva a refletir sobre casos do jornalismo brasileiro atual, onde grandes grupos de comunicação, alinhados a interesses nada democráticos, não hesitam em ocultar a verdade de seus leitores, ouvintes e telespectadores. Diferente do que acontece na série, as redes sociais acabam se tornando fontes de informação mais fidedignas do que a grande mídia.

O dilema de Kajta deixa de ser uma simples conclusão de sua primeira reportagem, que impactou a sociedade local, para se transformar em uma exposição sobre corrupção política, interesses de grupos econômicos e a tentativa de apagar uma verdade incômoda. Acompanhe a montagem desse quebra-cabeças informativo, em uma história bem construída e temperada com suspense, onde as revelações podem garantir que o verdadeiro inimigo do povo não é a verdade.